A Minha boémia
Ia indo, os punhos nos meus bolsos furados;
O meu casaco também vinha a ser ideal;
Ia sobre o céu, Musa! e estava teu leal;
Ah! Ai! Ai! que de amores esplêndidos eu sonhei!
A minha única calça tinha um largo buraco.
-Pequeno - pintainho sonhador, desfolhei no meu percurso
Rimas. A minha estalagem estava na Ursa - Maior.
As minhas estrelas no céu tinham um doce murmúrio
E escutei-as, assentado no bordo das estradas,
Nessas boas tardes de setembro em que sentia gotas
De orvalho na minha testa, como um vinho de vigor.
Onde, rimando ao meio das sombras fantásticas,
Como liras, tirava os elásticos
Dos meus sapatos feridos, um pé perto do meu coração!
Arthur Rimbaud
1854-1891
Farei cançoneta nova
Farei cançoneta nova
antes que vente, gele, chova;
minha dona me ensaia e prova
para saber como a amo;
mas por mais mal que me mova
não me livrará do seu liame.
mas por mais mal que me mova
não me livrará do seu liame.
Pois me rendo e prendo mais,
que me inscreva em seus anais.
Por ébrio não me tenhais
se esta boa dona amo;
sem ela não vivo, tais
o amor e a fome com que a chamo.
Mais branca sois que marfim,
outra alguma adoro assim.
Se em breve não tenho o sim
da boa dona que eu amo,
por S. Gregório, é meu fim
sem seu beijo em cama ou sob ramo.
Que vos vale, dona ideal,
se vosso amor me não vale?
Quereis ser monja, afinal?
Pois sabei, tanto vos amo,
temo que a dor me apunhale
se a bem não passa o mal que chamo,
Que vos vale se me enclausuro
e por vós não sou seguro?
Todo o bem é nosso, juro,
se me amais, dona, e eu vos amo.
A Daurostre, amigo puro,
peço e mando que cante piano.
Por esta tremo e estremeço,
de tão bom amor a amor.
E cuido que de igual preço
mais não dará de Adão o ramo.
Guillerme IX de Auqitâna
(1071 - 1127)
Livro da Vida
Vai o talento e a amizade
Nas folhas brancas pintando
Deste livro os seus primores.
Memorias de saudade
Aqui ficam retratando
As varias, dispersas flores
Que no caminho da vida
Se vão colhendo e esfolhando…
E esta é a historia sabida
De toda a vida – e da flor
Que é, que foi ou que será.
Eu deixo aqui só memoria,
De uma sincera vontade,
De afeição, de lealdade:
Deve ter lugar na historia
De que este livro é padrão,
Que é historia do coração
Almeida Garett
1799-1854
Beleza das mulheres
Beleza das mulheres, sua fraqueza, e suas mãos pálidas
Que fazem por vezes o bem e podem todo o mal,
E esses olhos, onde não há nada mais de animal
Que justo o suficiente para dizer: “basta” às fúria machistas.
E sempre, maternal calmando os protestos,
Mesmo quando ela mente, essa voz! Matinal
Apelo, ou canto bem doce da véspera, ou fresco sinal,
Ou belo soluço que vai morrer na dobra do xale! …
Homens duros! Vida atroz e feia aqui em baixo!
Ah! que ao menos, longe dos beijos e dos combates,
Qualquer coisa fica ainda um pouco sobre a montanha,
Qualquer coisa de um coração infantil e subtil,
Bondade, respeito! Pois o que é que nos acompanha
E verdadeiramente, quando a morte chegará, que resta?
Paul Verlaine
1844-1896
O homem e o mar
Homem livre, sempre tu acalentaras o mar!
O mar é o teu espelho; tu contemplas a tua alma
No desenvolvimento infinito da sua vaga,
E o teu espírito não é um golfo menos amargo.
Tu gostas de mergulhar no seio da tua imagem;
Tu o abraças dos olhos e dos braços, e o teu coração
Se distrai por vezes do seu próprio rumor
Ao barulho desta queixa incontável e selvagem
Vós sois os dois tenebrosos e discretos:
Homem, ninguém sondou o fundo dos teus abismos;
Ô mar, ninguém conhece a tuas riquezas intimas,
Tanto vós sois ciumentos de guardar vossos segredos!
E portanto eis ai os séculos inumeráveis
Que vós, vos combateis sem piedade nem remorsos,
De tal maneira que vós amais a carnificina,
Ô lutadores eternos, ô irmãos implacáveis!
Charles Baudelaire
O Profeta
Atormentado por uma sede espiritual,
Ia errando num escuro deserto
E um serafim com seis asas me apareceu
Na encruzilhada de um caminho.
Dos seus dedos ligeiros como um sonho,
Ele toca os meus olhos.
Meus olhos se abriram visionários
Como as de uma águia assustada.
Ele toca as minhas orelhas,
e elas se encheram
de barulhos e de rumores.
E compreendi a arquitectura dos céus
e o voo dos anjos sobre os montes,
e a via dos enxames
de animais marinhos sobre as ondas,
o trabalho subterrâneo
da planta que germina.
E o anjo, se inclinando sobre a minha boca,
me arranca a língua pecadora,
predicadora de frivolidades e de mentiras,
e entre os meus lábios gelados
a sua mão sangrante
meteu o ferrão do sábio serpente.
Com uma espada ele fendeu o meu peito
ele arranca o meu coração palpitante,
e no meu peito entreaberto
Elle planta uma brasa ardente.
Como um cadáver,
estava deitado no deserto,
E a voz de Deus me chama:
Levanta-te, profeta,
vê, escuta e percorrendo
e os mares e as terras,
Queima pela Palavra
Os corações dos humanos
Alexandre Sergueïevitch Pouchkine
Poemas 19ème siècle
Ô nostalgia dos lugares
Ô nostalgia de lugares que não o eram
bastante amados à hora passageira,
que eu desejo render-lhes de longe
o gesto esquecido, a ação complementar!
Voltar sobre os meus passos, refazer docemente
- e desta vez, só – tal viagem,
ficar na fonte mais tempo
tocar esta árvore, acariciar este banco…
Subir à capela solitária
que toda a gente diz sem interesse;
empurrar a porta desse cemitério,
se calar com ele que tanto se cala.
Pois não é o tempo que importa
de tomar contacto subtil e piedoso?
Tal era forte, mas a terra é forte;
tal ele se queixa: será que a conhecemos pouco.
Rainer Maria Rilke, Vergers, 1926
Uma ida ao Luxemburgo
Ela passou, a rapariga
Viva e ágil como um pássaro
Na mão uma flor que brilha,
Na boca um novo refrão
E talvez a única no mundo
Donde o coração ao meu responderia,
Que vindo na minha noite profunda
De um só olhar o esclareceria!
Mas não – a minha juventude acabou…
Adeus, doce raio que me iluminaste
Perfume, jovem rapariga, harmonia…
A felicidade passava – ela fugiu!
Gérard de Nerval
Elogio do amor
Todo o universo obedece ao amor;
Bela Psyché, submetei-lhe a tua alma.
Os outros deuses a esse deus fazem a corte,
E o seu poder é menos doce que a sua chama.
Dos jovens corações ele é o supremo bem
Amai, amai; tudo o resto não é nada.
Sem esse Amor, quantos objectos adoráveis,
Lambris dourados, madeiras, jardins e fontes,
Não têm alvo que não sejam emaciados,
Os seus prazeres são menos doces que as suas penas.
Dos jovens corações é o supremo bem
Amai, amai; tudo o resto não é nada
(Jean de la Fontaine)
Motivo
Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
— não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.
Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
— mais nada.
(Cecília Meireles)
Balada da neve
Batem leve, levemente,
como quem chama por mim.
Será chuva? Será gente?
Gente não é, certamente
e a chuva não bate assim.
É talvez a ventania:
mas há pouco, há poucochinho,
nem uma agulha bulia
na quieta melancolia
dos pinheiros do caminho...
Quem bate, assim, levemente,
com tão estranha leveza,
que mal se ouve, mal se sente?
Não é chuva, nem é gente,
nem é vento com certeza.
Fui ver. A neve caía
do azul cinzento do céu,
branca e leve, branca e fria...
- Há quanto tempo a não via!
E que saudades, Deus meu!
Olho-a através da vidraça.
Pôs tudo da cor do linho.
Passa gente e, quando passa,
os passos imprime e traça
na brancura do caminho...
Fico olhando esses sinais
da pobre gente que avança,
e noto, por entre os mais,
os traços miniaturais
duns pezitos de criança...
E descalcinhos, doridos...
a neve deixa inda vê-los,
primeiro, bem definidos,
depois, em sulcos compridos,
porque não podia erguê-los!...
Que quem já é pecador
sofra tormentos, enfim!
Mas as crianças, Senhor,
porque lhes dais tanta dor?!...
Porque padecem assim?!...
E uma infinita tristeza,
uma funda turbação
entra em mim, fica em mim presa.
Cai neve na Natureza
- e cai no meu coração.
Augusto Gil (1909)
* * * * * * *
Uma Criatura
Sei de uma criatura antiga e formidável,
Que a si mesma devora os membros e as entranhas,
Com a sofreguidão da fome insaciável.
Habita juntamente os vales e as montanhas;
E no mar, que se rasga, à maneira de abismo,
Espreguiça-se toda em convulsões estranhas.
Traz impresso na fronte o obscuro despotismo.
Cada olhar que despede, acerbo e mavioso,
Parece uma expansão de amor e de egoísmo.
Friamente contempla o desespero e o gozo,
Gosta do colibri, como gosta do verme,
E cinge ao coração o belo e o monstruoso.
Para ela o chacal é, como a rola, inerme;
E caminha na terra imperturbável, como
Pelo vasto areal um vasto paquiderme.
Na árvore que rebenta o seu primeiro gomo
Vem a folha, que lento e lento se desdobra,
Depois a flor, depois o suspirado pomo.
Pois esta criatura está em toda a obra;
Cresta o seio da flor e corrompe-lhe o fruto;
E é nesse destruir que as forças dobra.
Ama de igual amor o poluto e o impoluto;
Começa e recomeça uma perpétua lida,
E sorrindo obedece ao divino estatuto.
Tu dirás que é a Morte; eu direi que é a Vida.
Machado de Assis
* * * * * * *
«Às arvores»,
Arvores da floresta, vós conheceis minha alma!
À vontade dos invejosos, a multidão elogia e acusa;
Vós me conheceis, vós! – vós me vistes muitas vezes,
Só nas vossas profundezas, olhando e sonhando.
Vós o sabeis, a pedra onde corre um escaravelho,
Uma humilde gota de água de flor em flor caída,
Uma nuvem, um pássaro, me ocupam todo um dia.
A contemplação me enche o coração de amor.
Vós me vistes cem vezes, no vale obscuro,
Com essas palavras que diz o espírito à natureza,
Questionar baixinho vossos ramos palpitantes,
E do mesmo olhar prosseguir ao mesmo tempo,
Pensativo, a fronte baixada, o olhar na erva profunda,
O estudo de um átomo e o estudo do mundo.
Atentivo aos vossos barulhos que todos falam um pouco,
Arvores, vós me vistes fugir o homem e procurar Deus!
Folhas que estremeceis na ponta dos ramos,
Ninhos de onde au longe o vento semeia as penas brancas,
Clareiras, vales verdes, desertos sombrios e doces,
Vós sabeis que sou calmo e puro como vós.
Como ao céu nos vossos perfumes, meu culto a Deus se eleva,
E sou cheio de esquecimento como vós de silencio!
O ódio sobre o meu nome espalha enfim a sua bílis;
Sempre, - eu vos certifico, ó bosques amados do céu! -
Eu expulsei longe de mim todo o pensamento amargo,
E o meu coração é ainda tal qual o fez a minha mãe!
Arvores desses grandes bosques que estremeceis sempre,
Eu vos amo, e vós, hera ao limiar de outros surdos,
Vales onde se entendem filtrar as fontes vivas,
Arbustos que os pássaros pilham, alegres convivas!
Quando estou entre vós, arvores desses grandes bosques,
Em tudo o que me rodeia e me esconde ao mesmo tempo,
Na vossa solidão onde entro em mim mesmo,
Sinto alguém que me escuta e que me ama!
Também, bosque sagrado onde Deus mesmo aparece,
Arvores religiosas, carvalhos, musgos, floresta,
Floresta! É na vossa sombra e no vosso mistério,
É na vossa ramificação augusta e solitária,
Que quero abrigar o meu sepulcro ignorado,
E que quero dormir quando me adormecer.
Victor HUGO,
Les Contemplations, (As Contemplações) 1856
Aos amigos que partiam
Vós ides, caros amigos; o sopro ruga a onda,
Um belo reflexo de âmbar doura a frente do dia;
Como um seio virginal sob um beijo de amor,
A vela sob o vento palpita e se faz redonda.
Uma escuma de prata borda a vaga loura,
A borda afasta-se. – Eis ai Mante e sua segunda torre,
Depois cem outras torres se seguem por sua vez;
Em seguida Rouen a gótica e o Oceano que ralha
No dorso do velho leão, terror dos marinheiros,
Vós ides confiar a vossa frágil barca,
Adular com a mão a sua cabeleira de ondas.
Horácio fez uma ode ao navio de Virgílio:
Eu, imploro para vos, nestes catorze versos,
Os favores de Thétis, a deusa aos olhos verdes
Théophile Gautier (1811-1872)
Recolho: Poesias diversas (1838-1845).
Poeta, contista e ficcionista português, um dos grandes expoentes do modernismo em Portugal e um dos mais reputados membros da Geração Orpheu.
Distante Melodia
Num sonho de Íris morto a oiro e brasa,
Vem-me lembranças doutro Tempo azul
Que me oscilava entre véus de tule –
Um tempo esguio e leve, um tempo-Asa.
Então os meus sentidos eram cores,
Nasciam num jardim as minhas ânsias,
Havia na minha alma Outras distâncias –
Distâncias que o segui-las era flores…
Caía Oiro se pensava Estrelas,
O luar batia sobre o meu alhear-me…
– Noites-lagoas, como éreis belas
Sob terraços-lis de recordar-me!…
Idade acorde de Inter-sonho e Lua,
Onde as horas corriam sempre jade,
Onde a neblina era uma saudade,
E a luz – anseios de Princesa nua…
Balaústres de som, arcos de Amar,
Pontes de brilho, ogivas de perfume…
Domínio inexprimível de Ópio e lume
Que nunca mais, em cor, hei-de habitar…
Tapetes de outras Pérsias mais Oriente…
Cortinados de Chinas mais marfim…
Áureos Templos de ritos de cetim…
Fontes correndo sombra, mansamente…
Zimbórios-panteões de nostalgias,
Catedrais de ser-Eu por sobre o mar…
Escadas de honra, escadas só, ao ar…
Novas Bizâncios-Alma, outras Turquias…
Lembranças fluidas… Cinza de brocado…
Irrealidade anil que em mim ondeia…
– Ao meu redor eu sou Rei exilado,
Vagabundo dum sonho de sereia…
Mário de Sá-Carneiro (1890 / 1916)
Correspondências
A natureza é um templo onde viventes pilares
Deixam por vezes sair confusas palavras;
O homem passa através de florestas de símbolos
Que o observam com olhares familiares.
Como de longos ecos que de longe se confundem
Numa tenebrosa e profunda unidade,
Vasta como a noite e como a claridade
Os perfumes, as cores e os sons se respondem.
Há perfumes frescos como corpos de crianças,
Doces como os hautbois, verdes como os prados,
- E outros, corrompidos, ricos e triunfantes,
Tendo a expansão das coisas infinitas,
Como o âmbar, o almíscar, o benjoim e o incenso,
Que cantamos transportes do espírito e dos sentidos.
Charles Baudelaire
Maio
O Maio lindo Maio em barca sobre o Reno
As damas olhavam do cimo da montanha
Vós sois tão lindas mas a barca se afasta
Quem fez então chorar os salgueiros próximos
Ora os pomares florescidos se fixavam atrás
As pétalas caídas das cerejeiras de Maio
São as unhas daquela que tanto amei
As pétalas murchas são como as suas pestanas
Sobre o caminho da borda do rio lentamente
Um urso um macaco um cão levados pelos ciganos
Seguem uma rulote tirada por um burro
Enquanto se afasta nas vinhas renanas
Sobre um pífaro um ar de regimento
O Maio o lindo Maio adornado de ruínas
De hera de videira virgem e de roseiras
O vento do Reno sacode sobre a borda os vimes
E os juncos bávaros e as flores nuas das vinhas
Guillaume Apollinaire, Rhénanes, Alcools, 1913
IMPROMPTO
Banir toda recordação e fixar o pensamento,
Sobre um bom eixo em ouro e mante-lo a balançar,
Incerto, inquieto, imóvel portanto;
Eternizar talvez o sonho de um momento;
Amar o verdadeiro, o belo, procurar a sua harmonia;
Escutar no seu coração o eco do seu génio;
Cantar, rir, chorar, só, sem alvo, au acaso;
D’um sorriso, d’uma palavra, d’um suspiro, d’um olhar
Fazer um trabalho precioso, cheio de receio e de graça,
Fazer uma perola d’uma lagrima:
Do poeta neste mundo eis a paixão,
Eis a sua riqueza, a sua vida e a sua ambição.
Alfred de MUSSET (1839)
O espelho humano
« Irmão, nós vimo-nos num espelho humano
Que não poderemos nunca escurecer nem quebrar…
Atrás de nós o medo e o ódio e a morte
Murcham a felicidade que nós tínhamos sonhado
Mas à nossa frente no oriente, o dia nasceu
O presente tem nas suas mãos fortes
Os embriões de uma vida sem cuidados e sem limites…
A noite se faz muito pequena
E a terra reflecte um futuro sem mancha.”
Paul ELUARD
UM RAMINHO DE LIRIO DOS VALES
Será possível que tanta frescura
Nos vales se esconda agora
Para nos trazer um sinal de Beleza
Como um raio de sol ilumina a aurora!
O seu perfume sublime envolve o teu coração
Para te fazer feliz e cheia de esplendor
Como a luz que ilumina a tua alma
Como a gota de água do orvalho da manhã
Vindo assim purificar todos os teus dias
Que uma vida sem cessar feliz e sublime
Possa dar-te enfim uma felicidade íntima
Que tu partilharás com aquele que te ama
Que o Lírio dos Vales, te dê felicidade
Que esta real flor com tanta humildade
Seja para nós o sinal de um forte amor
Que nós levaremos até a eternidade!
Joaquim
Maio 2021
MEMÓRIA DE UMA EPIDEMIA
I
Nessas vilas outrora viventes
Hoje num silêncio crescente
Eu vejo a morte rodar
Para esses habitantes
Que num acto de errantes
Não se querem afastar
II
É a guerra me diz alguém
Com uma angústia reinante
Pois nesse país ocupado
Num deserto de penitentes
O inimigo está escondido
Onde se movem as gentes
III
Eu como tantos outros
Não me quero aventurar
O inimigo roda fingindo
E eu só no meu canto
Cumprindo as ordens dadas
Me tenho bem escondido
IV
Penso à nossa família
Mas aos amigos também
Que parecem se afastar
Gostaria de lhes dizer
Que não estão assim tão longe
Vivendo no meu pensar
V
Alguns brincam aos espertos
Desafiando as boas razões
Sem respeito e sem mente
Como pessoas perdidas
Tudo o que parece contar
É o prazer do presente
VI
A guerra, eles não a vêem
Visto que as bombas e as balas
Não caiem ao seu lado
Só conta a sua indolência
Para viver livremente
Mesmo se estão infectados
VII
Há também os que arriscam
A sua saúde ou a vida
Não para o seu bem-estar
Tendo sido designados
Eles podem ser sacrificados
Somente para nos ajudar
VIII
Por tanta abnegação
De valores manifestados
Vai a minha reverência
Que eles se protejam bem
Que nada lhes possa chegar
E que façam diligencia
IX
Não percamos a esperança
De ver chegar esse dia
Como para matar saudade
Que seja enfim brilhante
A força desse novo gesto
Encontrando a liberdade
X
Perto enfim uns dos outros
Num novo e belo encontro
Após esse tempo acabado
Será então com felicidade
E a alegria no coração
Que falaremos do passado
DS. Dionísio (2020)
Data da última actualização: 13/03/2024